O Iº de Dezembro: memória e liturgia cívica na 2ª metade de Oitocentos

Abstract

A comemoração do 1° de Dezembro, nos inícios da década de 1860, consagrou-se como uma das mais relevantes festas da liturgia cívica nacional, num contexto de reacção à crescente propaganda ibérica. A memória da Restauração de 1640 foi, assim, convocada pelas preocupações do presente suscitando a emergência de uma "tradição inventada" constituída por um conjunto de práticas de natureza ritual e simbólica com objectivos de inculcação de crenças, ideias e valores. A ritualização comemoracionista de Oitocentos, mais evidente em Portugal a partir de 1880 por via da acção dinamizadora republicana, teve na celebração do Io de Dezembro o seu momento fundacional recorrendo, desde logo, à ampla mobilização, à apropriação do espaço civil e à transferência da sacralidade do religioso para o laico e o profano.

In the early 1860s, the 1st of December celebration became one of the most relevant festivities of national civic liturgy, in a historical context marked by a reaction against growing Iberian propaganda. The memory of the Restoration of 1640 was thus summoned by present concerns, giving rise to the emergence of an "invented tradition" made up of a set of ritual and symbolic practices aimed at inculcating a number of beliefs, ideas and values. The 19th century's celebratory ritualization, which became more evident in Portugal after 1880 due to dynamic Republican actions, had its founding moment in the celebrations of the 1st of December. This was achieved by widespread mobilization, the appropriation of civil space, and by shifting the sacred from the religious to the secular and the profane.