Repressão de comportamentos femininos numa comunidade de mulheres: uma luta perdida no Recolhimento da Misericórdia de Coimbra (1702-1743)

Abstract

Este estudo, resultante da exploração de um livro de devassas a uma comunidade de recolhidas, pretende contribuir para a história da violência sobre os corpos e os espíritos, mas ambiciona também fornecer elementos para a desconstrução de uma imagem unívoca das mulheres que tão arreigadamente permanece, embora não passe de uma representação muito distante da realidade. E o ambiente revelado pelas devassas demonstra-o à saciedade: as recolhidas de Coimbra gritam, cantam, jogam, insultam-se, batem-se, desrespeitam as autoridades, comunicam com o exterior, adomam-se e envolvem-se em amores hetero e homossexuais. De facto, uma coisa é o discurso, o arquétipo, outra, muito diferente, a vida no seu quotidiano, as atitudes espontâneas e os sentimentos, que o historiador, muito mais penosamente, vai captando.

This study, the outcome of the research of a book of official inquiries to a community of secluded women (“recolhidas”), intends to contribute for the History of violence over bodies and souls, but seeks also to provide elements for the deconstruction of a univocal image of women that so deeply-rooted exists, though it is a distant representation of reality. And the environment revealed by the inquiries thoroughly demonstrates it: the “recolhidas” of Coimbra shout, sing, play, slander each other, hit each other, disobey the authorities, communicate with the outside world, embellish themselves and involve themselves in heterosexual and homosexual relationships. In fact, one thing is the speech, the archetype, and another, much different, the life in its daily routine, the spontaneous attitudes and the feelings, which the historian, painfully, tries to capture.